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Tem jeito: as instituições e os incentivos
O papel dos incentivos é fundamental, principalmente no momento em que vivemos, no qual as instituições públicas precisam dessa parceria com a iniciativa privada. Publicado em Sat Jan 09 13:00:00 UTC 2016 - Edição 901Estamos acostumados a ouvir que “brasileiro é malandro, gosta de tirar vantagem”. A nossa formação cultural seria a culpada por tanta corrupção por aqui. Já para os americanos e europeus seria natural, intrínseco àqueles seres, o respeito às regras e o cuidado com o bem-estar do próximo. Pois bem, para mim, mais importante que culparmos a cultura, é tratarmos de desenhar instituições que façam com que as pessoas tenham incentivos para agir corretamente.
O conceito central da Teoria dos Incentivos, inserida no ramo mais amplo da Teoria dos Jogos, é muito simples. Constantemente precisamos delegar a outras pessoas a execução de tarefas que precisamos fazer, mas que não são interessantes que façamos nós mesmos. Talvez porque outros possam fazer mais rápido e mais bem-feito do que a gente. Os estudiosos costumam chamar quem delega determinada atividade a um terceiro de principal. E, esse terceiro que é incumbido de realizar algo de interesse do principal, de agente.
Em um exemplo bem básico, você é o principal quando contrata um mecânico — no caso, o agente — para consertar o seu carro. O governo é o principal quando contrata uma construtora, a agente, para construir determinada obra — digamos, um novo prédio para uma escola pública. E nós, cidadãos eleitores, somos os principais quando delegamos poder aos governantes eleitos, os agentes.
Os interesses do principal e do agente, em muitos casos, são diferentes. Voltando ao nosso primeiro exemplo, quando você coloca o carro para consertar, quer que o serviço seja feito com muito cuidado, se possível com peças novas, e que seja uma solução duradoura. Por outro lado, o mecânico deseja, sim, deixar o cliente satisfeito, mas também tem interesses imediatos, como realizar o serviço no menor tempo possível para conseguir fazer o maior número de serviços. Tem interesse também em gastar o mínimo com materiais para que mais do valor pago fique para ele. Dependendo do sujeito, pode até querer que a solução dada não seja tão duradoura para que você volte e pague outras vezes por reparos. O pior é que dificilmente você vai conseguir distinguir entre um mecânico que agiu conforme você desejava e um que só pensou em maximizar o benefício próprio dele.
Diferentes objetivos e informação imperfeita entre o principal e o agente — o agente tem mais informações sobre a real qualidade e o nível de esforço empregado para fazer a atividade desejada pelo principal — são dois ingredientes básicos da Teoria dos Incentivos.
A Teoria dos Incentivos joga luz sobre como lidar de maneira ótima com esse problema do principal agente com que nos deparamos diariamente, em diversas esferas de nossa vida. É muito aplicada nas áreas de Economia, Ciência Política, Administração e Direito. Os estudiosos quebram a cabeça para encontrar maneiras de alinhar os incentivos do principal e do agente, de conduzir as transações para que sejam do tipo “ganha-ganha”, ou seja, realmente interessantes para todas as partes envolvidas.
Alinhamento de incentivos é o termo da vez. Principalmente neste momento de nossa economia, em que o setor público tanto precisa dos investimentos privados, um bom arranjo de incentivos é fundamental para que os objetivos de longo prazo do Brasil, de crescimento socioeconômico sustentável, sejam protegidos.
Com tanto conhecimento já acumulado sobre o tema, tantos estudiosos brilhantes indicando a direção, não dá mais para desenhar contratos e instituições de maneira ingênua, esperando que as pessoas ajam de maneira honesta, simplesmente porque deveria mesmo ser assim. É preciso levar em conta uma boa arquitetura de incentivos que conduza os diversos membros envolvidos em determinada atividade em direção ao bem comum. O papel dos incentivos é fundamental, já que até boas almas podem ceder a incentivos perversos para agirem de maneira desonesta.