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A Política na Gestão Democrática

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Publicado em 20.11.2007 - Edição 476

          No Brasil de hoje, é uma imprudência e quase uma heresia afirmar que a política é a atividade que nos define como cidadãos e que sua prática, tal como acontecia desde a antiga Grécia, estabelece a distinção entre as condições humanas da liberdade e da submissão. Isso porque, quando falamos em política, é sempre a política partidária que está em pauta — e não é sem razão que tenha sofrido tamanha desqualificação. A onda de escândalos sucessivos, orquestrados com impensável cinismo por alguns de nossos políticos, o descompromisso ostensivo com a coisa pública e a fragilidade de projetos coletivos em áreas decisivas para o bem-estar social transformaram a política em sinônimo de corrupção, conchavo e ineficiência.
         Um dos exemplos mais emblemáticos do grau de desmoralização da política no cenário nacional foi o slogan adotado pelo ex-governador Geraldo Alckmin durante o seu governo: “São Paulo não precisa de um político, mas de um gerente”. Além de infeliz e inoportuno — afinal de contas, tratava-se de um político de projeção nacional, candidato à Presidência da República rechaçando sua própria prática, quando deveria reedificá-la —, esse slogan vai na contramão de uma idéia que deveria ser cultivada, a de que democracia e política são indissociáveis. Ora, a não ser que ele se refira a modos de gerenciamento do tipo “Manda quem pode, obedece quem tem juízo”, a idéia veiculada pelo slogan contradiz tudo o que se pode esperar da atuação de um gestor em qualquer organização que opte por uma gestão democrática.
           Tal como acontece em uma nação ou um Estado federativo, é o exercício da política que sustenta uma gestão democrática nas organizações — públicas ou privadas. O que se pode afirmar, então, é que, ao contrário do que preconiza o slogan, o gerente em uma organização democrática é, por definição, um político. Ele não exercita política partidária, mas sua prática é política, na medida em que é um agente decisivo no desenvolvimento de uma gestão orientada pelos valores e princípios da democracia. São eles: a pluralidade (valorização da diferença e prática permanente de negociação e estabelecimento de acordos), a reciprocidade de poder e saber (reconhecimento da capacidade de cada um de contribuir e influenciar na concepção e operacionalização do projeto organizacional, independentemente do cargo ou da função que ocupe) e a interdependência (reconhecimento de que um projeto organizacional é sempre coletivo e, portanto, o seu êxito depende do empenho e da implicação de todos de forma responsável e autônoma).
          O papel do gestor é decisivo na implantação e no desenvolvimento de uma gestão orientada por esses princípios na organização, pois nada disso acontece de forma espontânea. Bem ao contrário, a tendência predominante é que se repitam, nas organizações, padrões de ação presentes em nossa cultura, ainda muito marcados pelo autoritarismo e privilégio de interesses privados.
          Ao implantar e sustentar fóruns de discussão e decisão; explicitar e mediar conflitos decorrentes de diferentes posições; negociar, sustentar, cumprir e fazer cumprir acordos estabelecidos; e exercer sua liderança e autoridade, não pela força do cargo que ocupa, mas pela capacidade de convencimento e de mobilização de sua equipe, o gerente está em pleno exercício da política. É esse exercício que se espera de um gerente que se propõe a implantar e desenvolver uma gestão democrática na organização.
          O exercício da política continua sendo, portanto, um divisor de águas. Na antiga Grécia, ele distinguia os escravos dos cidadãos; nas organizações, ele diferencia uma gestão que implementa a autonomia e a liberdade ou cultiva a dependência e a submissão entre os atores da cena organizacional. A prática da gestão democrática depende, portanto, de um gestor que, antes de qualquer coisa, é um bom político, na melhor acepção da palavra.


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