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Preço x Valor: a Origem da Crise Americana
Por que a confusão entre esses dois importantes conceitos explica a origem da crise que está afetando todo o mundo. Publicado em 30.11.2008 - Edição 530
Se em períodos de “normalidade” econômica já é importante distinguir “preço” de “valor”, em tempos de crise entender essa diferença se torna essencial. De forma bem simples, o preço de um bem ou serviço é definido como a quantidade de moeda que o vendedor e o comprador aceitam para realizar uma transação no mercado. Ou seja, o preço é dado pelo mercado, obedecendo a lei da oferta e procura, num nível de preço aceito, gostando ou não, pelas duas partes.
Já determinar o valor de um bem ou serviço é um pouco mais complexo. De fato, uma pessoa pode chegar ao mercado para vender um produto achando que ele vale um determinado preço, mas ao fazer a oferta pode ser surpreendido, pois o mercado só aceita pagar um preço inferior ao que o ofertante acha justo. Evidentemente, pode ocorrer o inverso: o vendedor percebe que o mercado aceita pagar um preço maior do que esperava como sendo o valor adequado do produto.
Essa diferença entre preço e valor acontece, principalmente, porque o valor tem dois componentes: valor de uso e valor de troca. O valor de troca é o somatório das despesas pagas para se levar o produto ao mercado. É a soma do dinheiro gasto com salários, matérias-primas, energia, aluguel do prédio da fábrica ou da loja, logística, impostos, juros, lucro, enfim, todos os gastos para ofertar o bem ou serviço no mercado. O valor de troca é materialmente perceptível, ou seja, é tangível e racional.
O valor de uso (ou de utilidade), por sua vez, é intangível, imaterial e fruto da emoção. Pode ser exemplificado como aquele valor que o consumidor aceita pagar pela grife mais chique ou por uma necessidade, mesmo momentânea (guarda-chuva quando o tempo fecha inesperadamente); por modismos; status; prazer; por uma obra de arte peculiar; etc. Por sua vez, sendo idealizado, imaterial, o valor de uso é facilmente manipulado pela publicidade e pelos negociantes mais “espertos”. Ou seja, o valor de uso pode levar o mercado de um bem ou serviço a um nível de preço acima da quantidade de moeda que seria “normal” esperar caso os compradores não fossem tão facilmente tomados pela emoção.
É comum se fazer confusão entre valor de uso e lucro. Mas, de fato, valor de uso não é apenas lucro e tem rebatimentos em toda a estrutura de custos (composição de preços) dos bens ou serviços. Também é verdade que o valor de uso pode ser percebido como o fermento que faz crescer os preços. Assim, em doses erradas, pode formar bolhas ou, por outro lado, não dar bom resultado.
Na atual crise imobiliária nos EUA, o que aconteceu foi exatamente o crescimento do nível de preços dos imóveis por valores — de uso — totalmente fora da realidade, aproveitando-se de consumidores eufóricos, manipulados pelo sistema financeiro americano. Quem não estava anestesiado pelo clima de euforia podia facilmente perceber: (I) Um apartamento em Miami foi comprado e hipotecado por US$ 120 mil (preço igual ao valor) em janeiro de 2004; (II) Catorze meses depois, em março de 2005, o gerente de um banco percebeu que os imóveis em Miami tinham se valorizado (apenas seu valor de uso) e propôs ao proprietário um empréstimo de US$ 190 mil, para quitar a dívida com o outro banco e ainda com taxa de juro menor (a essa época, a oferta de dinheiro crescia e os juros baixavam nos EUA). (III) Em fevereiro de 2006, o mesmo apartamento, que inicialmente custou US$ 120 mil, foi hipotecado por US$ 250 mil. O proprietário gastou boa parte do dinheiro consumindo produtos chineses e, agora, está endividado, inadimplente e sem teto.
Moral da história: (1) Nos EUA, negociantes inescrupulosos criaram valores de uso inconsistentes, e consumidores desinformados confundiram preço com valor (por isso, o mundo todo está em crise). (2) Deixar-se iludir pelo valor de uso pode ser problemático.
Um ponto importante: a ciência econômica, até a teoria de Marx, preconiza que, no longo prazo, preço e valor tendem para um ponto de equilíbrio. Todavia, sobram algumas questões: (a) Quanto tempo (físico) demora para chegar no longo prazo? (b) Onde pode estar sendo formada uma nova bolha, afastando preço do valor? (c) Qual a magnitude e repercussão do estouro de uma bolha? As respostas da economia para essas questões devem ser inspiradas menos nas ciências exatas do que na ciência médica, esta com a sua grande verdade: “é melhor prevenir do que remediar”. Ou seja, é melhor se cuidar e ficar atento para perceber se os preços estão muito afastados dos valores!
Já determinar o valor de um bem ou serviço é um pouco mais complexo. De fato, uma pessoa pode chegar ao mercado para vender um produto achando que ele vale um determinado preço, mas ao fazer a oferta pode ser surpreendido, pois o mercado só aceita pagar um preço inferior ao que o ofertante acha justo. Evidentemente, pode ocorrer o inverso: o vendedor percebe que o mercado aceita pagar um preço maior do que esperava como sendo o valor adequado do produto.
Essa diferença entre preço e valor acontece, principalmente, porque o valor tem dois componentes: valor de uso e valor de troca. O valor de troca é o somatório das despesas pagas para se levar o produto ao mercado. É a soma do dinheiro gasto com salários, matérias-primas, energia, aluguel do prédio da fábrica ou da loja, logística, impostos, juros, lucro, enfim, todos os gastos para ofertar o bem ou serviço no mercado. O valor de troca é materialmente perceptível, ou seja, é tangível e racional.
O valor de uso (ou de utilidade), por sua vez, é intangível, imaterial e fruto da emoção. Pode ser exemplificado como aquele valor que o consumidor aceita pagar pela grife mais chique ou por uma necessidade, mesmo momentânea (guarda-chuva quando o tempo fecha inesperadamente); por modismos; status; prazer; por uma obra de arte peculiar; etc. Por sua vez, sendo idealizado, imaterial, o valor de uso é facilmente manipulado pela publicidade e pelos negociantes mais “espertos”. Ou seja, o valor de uso pode levar o mercado de um bem ou serviço a um nível de preço acima da quantidade de moeda que seria “normal” esperar caso os compradores não fossem tão facilmente tomados pela emoção.
É comum se fazer confusão entre valor de uso e lucro. Mas, de fato, valor de uso não é apenas lucro e tem rebatimentos em toda a estrutura de custos (composição de preços) dos bens ou serviços. Também é verdade que o valor de uso pode ser percebido como o fermento que faz crescer os preços. Assim, em doses erradas, pode formar bolhas ou, por outro lado, não dar bom resultado.
Na atual crise imobiliária nos EUA, o que aconteceu foi exatamente o crescimento do nível de preços dos imóveis por valores — de uso — totalmente fora da realidade, aproveitando-se de consumidores eufóricos, manipulados pelo sistema financeiro americano. Quem não estava anestesiado pelo clima de euforia podia facilmente perceber: (I) Um apartamento em Miami foi comprado e hipotecado por US$ 120 mil (preço igual ao valor) em janeiro de 2004; (II) Catorze meses depois, em março de 2005, o gerente de um banco percebeu que os imóveis em Miami tinham se valorizado (apenas seu valor de uso) e propôs ao proprietário um empréstimo de US$ 190 mil, para quitar a dívida com o outro banco e ainda com taxa de juro menor (a essa época, a oferta de dinheiro crescia e os juros baixavam nos EUA). (III) Em fevereiro de 2006, o mesmo apartamento, que inicialmente custou US$ 120 mil, foi hipotecado por US$ 250 mil. O proprietário gastou boa parte do dinheiro consumindo produtos chineses e, agora, está endividado, inadimplente e sem teto.
Moral da história: (1) Nos EUA, negociantes inescrupulosos criaram valores de uso inconsistentes, e consumidores desinformados confundiram preço com valor (por isso, o mundo todo está em crise). (2) Deixar-se iludir pelo valor de uso pode ser problemático.
Um ponto importante: a ciência econômica, até a teoria de Marx, preconiza que, no longo prazo, preço e valor tendem para um ponto de equilíbrio. Todavia, sobram algumas questões: (a) Quanto tempo (físico) demora para chegar no longo prazo? (b) Onde pode estar sendo formada uma nova bolha, afastando preço do valor? (c) Qual a magnitude e repercussão do estouro de uma bolha? As respostas da economia para essas questões devem ser inspiradas menos nas ciências exatas do que na ciência médica, esta com a sua grande verdade: “é melhor prevenir do que remediar”. Ou seja, é melhor se cuidar e ficar atento para perceber se os preços estão muito afastados dos valores!