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Por uma Visão Estruturadora da Cidade e do Território

Mais que implementar medidas cosméticas, é essencial que os gestores retomem as ações de planejamento urbano nas cidades brasileiras.
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Publicado em Sun Oct 05 18:12:00 UTC 2008 - Edição 522
          Há pouco mais de uma década, começaram a aparecer vasos de plantas nos espaços públicos das cidades brasileiras, numa tentativa vã de embelezá-las. Nada contra os artesãos que os produzem ou contra quem os encomenda. Na administração pública, restaram poucas ações válidas e eficazes para enfrentar a falta generalizada de planejamento. Os vasos não são um mal em si ou um mal maior do que a afronta ao gosto, à escala urbana de uma cidade pretensamente grande e à pequenez das ações urbanas. Mas quando o seu uso começa a se tornar uma constante, nas mais diversas intervenções, há de se desconfiar que algo está muito errado. Um vaso (ou outro objeto equivalente) colocado aqui, ali e alhures não soluciona o maior problema de qualquer outra cidade: a ausência, na administração pública, de uma visão estruturadora da cidade e do território, que, na ótica de Le Corbusier, integra as diversas funções urbanas, a exemplo de morar, circular, trabalhar e recrear.
          Diante de tantos desafios da cidade contemporânea, haverá um gestor capaz de tornar realidade propostas estruturadoras do espaço físico da cidade e do território? Aqui estamos nos referindo a espaço físico da forma mais ampla, como aquele que abriga a totalidade das relações humanas, e não espaço físico restrito, que abriga interesses de grupos específicos. Quando a cidade não é de todos, ela não é de ninguém.
          A endêmica miopia dos gestores das cidades deve ser tratada com uma lente que lhes proporcione o que podemos entender por visão sistêmica da urbanidade. Essa visão contempla todos os tempos cronológicos com a mesma atenção. O passado, que é o patrimônio existente, e as ações válidas do presente, que serão patrimônio amanhã. No tempo presente, também identificamos as necessidades satisfeitas ou a caminho de sua satisfação, o direito à volta das utopias que o futuro proverá.
          As últimas ações de planejamento relevantes, no âmbito das cidades, foram feitas nos anos de 1970. A crise econômica dos anos de 1980 e início dos anos de 1990 não permitiram sua implantação. Os anos recentes, de estabilidade econômica e até de prosperidade, não foram suficientes para vislumbrarmos mudanças expressivas de atitudes dos gestores municipais condizentes com as oportunidades do momento. Inexiste, e não se propõe, um órgão de planejamento e gestão urbana da cidade num modelo que seja autônomo, à prova dos humores da política e dotado de um corpo técnico competente, e não por arrivistas pinçados das hostes palacianas ou partidárias. Um órgão cujas atribuições também sejam uniformizar as informações, padronizar os procedimentos, agilizar e integrar as ações, que atue nas partes de forma articulada, dentro de um planejamento espacial estratégico, economicamente sustentável, ambientalmente responsável, socialmente justo e culturalmente pulsante.
          Por melhor que sejam as intenções, decisões que não levem em conta a visão estruturadora da cidade e do território podem resultar em inócuos efeitos cosméticos que não salvam o Frankstein que são as desarticuladas cidades brasileiras.

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