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500 anos de sebastianismo (*)

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Publicado em Sun Sep 17 12:49:00 UTC 2000 - Edição 104
Foi a cultura ibérica que plasmou todas as nossas instituições econômicas, políticas e jurídicas. Entender o País nos seus mais diversos aspectos requer incursões nessa herança. Portugal e Espanha, mais que qualquer nação da Europa ocidental, por contingências históricas, travaram, algumas vezes entre elas próprias, lutas seculares para preservarem a independência política e a identidade nacional.

A luta tenaz para sobreviverem como nação requeria lideranças fortes e incontestes e uma alta coesão interna. O resultado foi uma organização social altamente centralizada, ao contrário da grande maioria das nações da Europa ocidental cujo sistema feudal permitiu a existência de um maior balanceamento do poder. O poder enfeixado nas mãos de uma única pessoa - no caso, o soberano - acostumou o povo a uma inércia, a colocar seus destinos e aguardar providências vindas desse que a todos protegia. Esse fenômeno é básico na cultura ibérica e nas suas colônias.

A conseqüência disso seria o surgimento de um fenômeno chamado de sebastianismo, presente na cultura ibérica e marcante da nossa cultura, seja ela empresarial ou política. Esse traço cultural caracteriza-se pela espera de uma "salvação" ou solução vinda de fora, de algum outro lugar e concentrada na figura de uma única pessoa. Descrê-se, assim, nas próprias forças, nas próprias soluções e fica-se a espera de um líder, um D. Sebastião saído do mar ou das urnas, pronto para "esmagar" o inimigo.

Os efeitos negativos desse traço cultural são marcantes na sociedade brasileira. À medida que se espera um agente externo para resolver as dificuldades, não só há descompromisso com as soluções como, também, não são assumidos os eventuais fracassos. E essa é outra característica do sebastianismo: a tentativa de se livrar de qualquer culpa, tornando a autocrítica um exercício desprovido de sentido. Na ocorrência de um insucesso é só esperar um novo salvador. Alguns políticos foram quem melhor perceberam esse nosso traço e, não raras vezes, o exploraram (e o exploram) com excepcional maestria.

(*) Denominação dada à crença na volta de D. Sebastião (1554-1578), rei de Portugal, que desapareceu numa batalha na África.

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